domingo, 17 de maio de 2009




Lembras-te de corrermos junto nos fins de tarde no meio das cearas onde fazíamos a cama e dizíamos que as nuvens eram algodão doce em forma de criaturas do céu? De quando vimos neve pela primeira vez, que a mãe nos foi buscar para a cama dela e que víamos pelos vidros da janela todos os nossos amiguinhos da rua com cenouras que davam cor aos enormes bonecos de neve que só não os construimos também porque não podias sair de casa e eu decidi ficar contigo para que não ficasses triste. E de quando estavas doente? Que brincávamos de médicos, com todos aqueles equipamentos com que crescemos e que forçadamente tiveste que aprender a viver com eles a vida toda. Quem me dera que soubesses que sinto a falta de tudo isso, mesmo quando passámos toda a nossa infância separados, que chorava de noite e chamava por ti e por aquela que ainda nos dias de hoje me faz falta todos os dias ... todas as noites. Nunca te disse na altura, não compreenderias nem eu própria o entendia, sentia apenas. Todas as vezes que via aquela mala azul, aquela azul que levava tudo aquilo de que irias precisar e mais aquilo que ainda hoje sinto que me roubaste sem teres noção disso. Ficava entregue aqueles que me tentavam dar tudo aquilo que estavas a receber, que se esforçavam em compreender o porquê do meu sorriso constante, o porquê do meu afecto por todos aqueles que eram e não eram estranhos, que me metiam de castigo porque no entender deles eu teria que beber o leite antes de ir para a escola, para crescer para ficar uma menina grande, sabendo tu que ainda hoje eu não o faço porque o detesto. Gostava que soubesses disso mais cedo, para não me estranhares agora. Gostava de ter crescido contigo mesmo que fosse sempre no hospital, chorar quando tu choravas, sentir todas aquelas dores que tu sentias, brincar naquela salinha que tu tanto falavas onde tinhas meninos igual a ti, antes queria ser como tu. Lembras-te da tua terceira classe? Onde a fazia entre a cama do hospital e o teu quarto? Que te esforçavas a fazer todas aquelas contas, copias e mais copias e eu muito orgulhosa dizia que o meu irmão era o mais inteligente lá da escola, porque conseguia passar de ano sem ter que ir às aulas. Sempre te tentei proteger, defender de todas aquelas crianças que achavam estranho a tua forma de viver. Perdoei-te todas as ausências que me causaste porque sabia que precisavas delas mais que eu. Mas hoje não te perdoou toda esta dor que me causas. Deixaste de ser pequenino, cresceste e peço-te por favor que não me leves mais uma vez aquilo que ainda me faz muita falta.

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